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Entre Likes e Rejeição: A Cultura Incel, a Regra dos 80/20 e o Silêncio das Famílias

Juventude Perdida? Redes Sociais, Exclusão Invisível e a Crise do Diálogo Familiar

20/03/2025 às 17h37 Atualizada em 20/03/2025 às 17h51
Por: Redação I Fonte: Rosana Medina
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Foto: Divulgação
Foto: Divulgação

Nos dias de hoje, a adolescência é moldada por uma interação complexa entre o mundo digital e a realidade offline. A série Adolescência, ambientada na Inglaterra, em um período conhecido como a "idade da lei penal", onde as regras sobre a responsabilidade criminal de menores são rigorosas. No Reino Unido, a idade mínima de responsabilidade criminal é de 10 anos, uma das mais baixas do mundo ocidental. Isso significa que crianças podem ser processadas e condenadas por crimes ainda muito jovens. Traz à tona questões urgentes sobre rejeição, violência e a crescente radicalização de jovens em comunidades virtuais. Entre os conceitos abordados, destacam-se a cultura incel, a Regra dos 80/20 e os códigos invisíveis que regem as interações digitais.

O Fenômeno INCEL e a Frustração Masculina

O termo incel (abreviação de involuntary celibate, ou "celibatário involuntário") surgiu como um espaço de apoio para pessoas que enfrentavam dificuldades em estabelecer relações amorosas. Com o tempo, no entanto, algumas comunidades incels se tornaram verdadeiros territórios de ressentimento e misoginia. Jovens que se sentem excluídos ou rejeitados pelas mulheres passam a acreditar que o sistema está contra eles, reforçando uma visão fatalista e, em casos extremos, violenta.

Na série, acompanhamos Ryan, um adolescente solitário que, após sucessivas rejeições, encontra consolo em fóruns online onde outros jovens compartilham experiências semelhantes. No início, ele se sente compreendido, mas, conforme se aprofunda nesse universo, passa a adotar um discurso cada vez mais agressivo e radicalizado.

A série mostra como a solidão e a falta de pertencimento podem levar jovens vulneráveis a buscar refúgio em comunidades que validam sua dor, mas ao mesmo tempo os incentivam a nutrir um ódio crescente pelo mundo ao seu redor.

A Regra dos 80/20 e a Sensação de Injustiça Social

A Regra dos 80/20, derivada do Princípio de Pareto, também aparece na narrativa como um dos conceitos que alimentam a frustração desses jovens. Segundo essa teoria, 20% dos homens considerados mais atraentes recebem 80% da atenção romântica e sexual das mulheres, deixando os outros 80% competindo pelas mínimas oportunidades restantes.

Para Ryan e seus amigos, essa "realidade" torna-se uma justificativa para sua exclusão. Eles passam a acreditar que mulheres só escolhem os mais "privilegiados", enquanto homens comuns são destinados ao fracasso amoroso. Esse pensamento, amplamente disseminado em comunidades incels, reforça o ressentimento e a busca por vingança contra a sociedade.

A Linguagem das Redes: Cores e Símbolos na Aceitação e Rejeição

Outro elemento impactante na série é a representação dos códigos digitais ocultos, que funcionam como uma linguagem secreta entre os adolescentes. Emojis, cores e símbolos determinam status social e pertencimento dentro dos grupos.
•    Corações de diferentes cores ❤️💙💛 indicam níveis de lealdade e aproximação.
•    Fogo 🔥 e caveira 💀 são usados em desafios perigosos para testar coragem.
•    Cinza escuro ou preto ⚫️ representa isolamento e bloqueio.
•    Verde-neon 💚 simboliza desafios e pactos secretos.
•    Números específicos, como 13, aparecem como sinais de rebeldia e iniciação em grupos "exclusivos".

Esses detalhes revelam um código de inclusão e exclusão que se torna quase invisível para os pais e adultos, dificultando ainda mais a identificação de padrões de isolamento ou influência negativa.

O Abismo entre Pais e Filhos: A Falta de Diálogo e Reconhecimento

Talvez um dos aspectos mais perturbadores da série seja a forma como os pais dos adolescentes estão totalmente desconectados da vida de seus filhos.
•    Muitos ignoram os sinais de alerta, acreditando que suas dificuldades são apenas fases passageiras.
•    Outros tentam impor autoridade, mas falham em compreender as emoções e os dilemas que os jovens enfrentam no mundo digital.
•    A maioria dos pais não tem a menor ideia da profundidade das influências online, deixando seus filhos vulneráveis à radicalização e pressões sociais invisíveis.

A falta de diálogo e de reconhecimento emocional cria um vácuo onde influenciadores e comunidades online assumem o papel de "guia", oferecendo pertencimento, mas também disseminando ideias destrutivas.

A Relação Entre Redes Sociais, Rejeição e Radicalização

A trama também ilustra como as redes sociais amplificam a sensação de exclusão, ao expor constantemente a vida de outras pessoas e reforçar padrões inatingíveis de beleza, status e sucesso. Os personagens passam horas consumindo conteúdos que confirmam suas inseguranças e solidificam suas crenças sobre hierarquias sociais imutáveis.
No final, a série não apenas denuncia essas ideologias, mas também questiona até que ponto a falta de suporte emocional, a solidão e o ambiente digital contribuem para transformar frustrações legítimas em discursos de ódio e radicalização.

O Final Vazio: Reflexão sobre um Ciclo que se repete

Ao final da série, ficamos com uma sensação de vazio e impotência. Nenhuma grande solução é apresentada, e o ciclo de exclusão, violência e rejeição parece continuar. Esse desfecho nos obriga a refletir: até quando deixaremos que a história se repita?

A narrativa nos mostra que, enquanto não houver um espaço seguro para os jovens expressarem suas angústias sem medo de julgamento, e enquanto pais e educadores continuarem distantes, as redes sociais e as comunidades digitais continuarão exercendo um papel de educadores sombrios. O desafio, portanto, é criar pontes entre as gerações antes que o vácuo seja preenchido por discursos destrutivos.

A série Adolescência escancara um problema profundo e real: a necessidade de compreensão e conexão entre gerações em um mundo dominado pelo digital. Cabe a nós decidir se apenas assistiremos a esse ciclo se repetir ou se buscaremos uma verdadeira mudança.

Por Rosana Medina
Neuroeducadora/Neuropsicóloga e Terapeuta Comportamental

 

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Sonia Resende Há 4 semanas Passa Três, RJ Acabei de assistir a série. Fiquei muito impressionada. Já tenho uma preocupação com o futuro mental dessa juventude que tanto se espelham e seguem os padrões exibidos nas redes sócias. A maior batalha deverá ser dos familiares, pois é na convivência que se obtém/observam a carência. Quanto ao artigo acima explanando a essência da série está excelente! Parabéns Dra. Rosana! Deus abençoe o seu caminho cada dia mais para que você ajude aqueles que precisam de cura mental.
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Rosana Medina
Rosana Medina
Sobre Neuroeducadora/Neuropsicóloga e Terapeuta Comportamental, criou o método Medina de ensino, que visa mapear e entender do modo como pensamos e sentimos as experiências. Implantou no colégio da polícia militar da Bahia, trabalha com diagnósticos de aprendizagens, desenvolvimento pessoal e profissional.
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