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Professor: bem-estar comprometido, sociedade prejudicada

Neste artigo Francisco Gutemberg convida seus interlocutores à auspiciosa reflexão dialética a respeito da Educação Brasileira; e de como a figura do professor fora destituída de protagonismo e dignidade.

01/06/2025 às 16h04 Atualizada em 01/06/2025 às 16h36
Por: Redação I Fonte: Francisco Gutemberg
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Foto: Divulgação
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O atual Sistema de Ensino Brasileiro, cujo carro chefe é o Ministério da Educação, traz ainda consigo diversas falhas em questões essenciais da política educacional, seja na administração e gestão dos seus recursos, seja na equivocada adoção de um modelo político-pedagógico descomprometido com as fisionomias culturais de nosso povo. Este posicionamento é fato retardatário da evolução da qualidade do ensino no país, naquilo que se preocupa exclusivamente com alguma formação técnica em atenção à indústria e à produção. Estas falhas ensejam equívocos que limitam a evolução do próprio país, haja vista a posição estratégica ocupada pela Educação, inclusive no desenvolvimento econômico de qualquer nação. No seu papel de condutor da Educação brasileira e importante regulador das normas que amparam o Ensino, notadamente o público, o MEC comporta-se como mera ferramenta político-partidária, num quase total descompromisso com a nobre causa educacional, chancelando decisões e programas sem o natural aval técnico das comunidades acadêmica e escolar. Sua maior preocupação chama-se ENEM, pasmem! 

Um dos protagonistas nesta peça do “faz de conta”, o professor, resigna-se a um triste papel de inoperância, fugindo de novos conflitos, evitando maiores dissabores e desgastes, já que o fardo cotidiano das aulas, das agressões de seus alunos, das correções de provas em casa, dos conselhos de classe, das intermináveis reuniões pedagógicas etc, o massacram já suficientemente.  O professor contemporâneo descaracterizou-se, perdeu sua força, suas filiações mais caras, que o identificavam e o enobreciam perante a sociedade, naquilo que representava a respeitabilidade, o crédito e o repouso em sua nobreza e postura; rastrearam o seu ímpeto e tiraram-lhe o baluarte e o orgulho da profissão, humilharam-no em praça pública, porque sempre representou a revolução! Culpa de toda a sociedade, de cada um que inclina-se a votar no vereador da cesta básica e do trio elétrico; mas culpa notadamente do Estado, nas figuras do pernicioso dirigente de Governo; do parlamentar irresponsável em farta criatividade para a pilhagem e a hipocrisia; da Imprensa e seus dirigentes e repórteres bem engomadinhos de TV que, em horário nobre, se esforçam para lavar as mãos em matérias cínicas onde fingem mostrar-se preocupados com a Educação, enquanto patrocinam o ridículo, o estúpido e o desprezo pela inteligência humana em seus programas tipo BBBs; culpa, ainda, de um corpo judiciário descomprometido com a causa popular, dos mais pobres, senhores de preto sempre atentos a considerarem qualquer justo movimento grevista como atentado ao seu chefe, àquele que o colocou lá, meu sinhorzinho o Governador: que o sindicato dos professores paguem por cada dia de paralização, sentencia o toga filhinho de mamãe. Disto, vai-se, em boa parte, o desejo de lecionar e a ambição pela mudança. Compromete-se o futuro e o desenvolvimento, ao tempo em que se mantem o status quo de poder das 5 elites, industrial, bancária, latifundiária, militar e de comunicação de massa, estas mesmas que se empenham, há séculos, no maravilhoso esforço de idiotização do povo, colorindo o desenho a cada Carnaval, São João e Ano Novo,... , e segue o trem da alegria, enquanto o caos corre lá fora.

Neste cenário pouco aprazível, a figura do professor se oculta por trás de promessas fáceis e de uma enxurrada de projetos educacionais os quais, verdadeiramente, poucos resultados trazem para a alteração do atual quadro. O professor adoece de forma cruel, vagarosamente, ao longo dos anos de labuta, sem maiores cuidados por parte do Estado, sem acenos de apoio e sem ressonâncias aos seus lamentos. Em um contexto que se rascunhe a necessidade de se preservar a saúde do trabalhador como um todo, a figura do professor se enquadra com características bem sui generis, haja vista a posição estratégica que, apesar dos pesares, ainda ocupa em nossas sociedades, bem como a grave exigência que se faz de sua performance. 

Além das razões expostas para o grave adoecimento de nossos profissionais da educação, outras ultrapassariam os muros escolares, no que atingem praticamente a todos os trabalhadores. A começar pela própria redefinição de espaço de interação social que a contemponeidade trouxe para as pessoas, identificado a ambientes quadrados e frios, do tipo shopping center, onde as comunicações se dão menos no plano da análise e subjetividade humana do que no espaço curto e limitado dos diálogos de compra e venda. E longe dos neos dos centros comerciais, é em casa, nos passeios pela web, que gostamos de gastar tempo, cuidando bem do smartfone, o “melhor amigo” da criança e do adulto, onde  expandimos nosso papel de consumidor, onde mostramos até aonde vai nossa capacidade de nos apequenar em nossa grandeza humana, nos ridicularizarmos, de brincar de fingir que somos “outro”, tolos que nos tornamos, reféns da chamada cibercultura; tudo em detrimento aos calorosos encontros familiares, cada dia mais enfadonhos e menos constantes e atraentes. Estamos perdendo o interesse pelo diálogo presencial, pelo encontro, o olhar, apostando muito mais nas nossas individualidades discursivas, nas “curtidas” das nossas “selfies”. Daí uma certa solidão que afasta, entorpece e esfria os indivíduos, perigosamente. O professor, em tal contexto, e também sofrendo os efeitos agressivos de diversas outras intempéries, é uma presa fácil às doenças da modernidade, em especial à depressão. 

Com a saída de cena da figura do professor tradicional, em nome dos sublimes e elevadíssimos novos conceitos da Pedagogia “do capital”, foi alocado em seu lugar o espantalho-tecnocrata pós-moderno especialista em Educação, formado via EAD por alguma dessa siglas estranhas que existem por aí, indicado pela “base governista”, o qual gasta todo o seu entorno vocabular em definições daquilo que verdadeiramente desconhece, mas que pode render lucros ou risos, numa perfeita afinação com o que forma retardados, “Salve o novo secretário de Educação”. E assim escolhem os mentores da educação brasileira atualmente, através de indicações políticas e podres apadrinhamentos, o que demonstra total desrespeito com a nossa população, vítima sem voz e representatividade. 

Há enormes e graves mudanças a serem realizadas em prol de um melhor ensino público no país, e a sociedade civil brasileira precisa reavaliar seu posicionamento em relação à formação das novas gerações. Nesta revisão, ter-se-á que, necessariamente, trazer à luz questões que envolvam a participação mais efetiva do professor nestes novos contextos que a sociedade contemporânea virtualizada, resgatando-lhe o protagonismo. Disso, não se pode permitir que um elemento de tão alta estatura para o progresso de nossa cultura possa ser tão irresponsavelmente negligenciado, ridicularizado e explorado da forma vil como vem ocorrendo.

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Jonielson CostaHá 3 semanas IpiráExcelente artigo,professor!Parabéns
CletaHá 3 semanas BahiaUma escrita limpa, lúcida, sem rodeios, com críticas coerentes sobre o nosso sistema de ensino fracassado e que tem comprometido o futuro de nossa sociedade. Parabéns!!
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